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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO
AO REINO DO BAHREIN

por ocasião do "Bahrain Forum for Dialogue: East and West for Human Coexistence"
(3 - 6 DE NOVEMBRO DE 2022)

ENCONTRO COM OS JOVENS   

DISCURSO DO SANTO PADRE

Escola do Sagrado Coração em Awali
Sábado, 5 de novembro de 2022

[Multimídia]

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Queridos amigos, irmãos e irmãs, bom dia!

Agradeço por vos encontrardes aqui, vindos de tantas nações diferentes e com tanto entusiasmo! Quero agradecer à Irmã Rosalyn as palavras de boas-vindas que me dirigiu e o empenho com que dinamiza, juntamente com muitos outros, esta Escola do Sagrado Coração.

E fiquei contente por ter visto, no Reino do Bahrein, um país de encontro e diálogo entre diferentes culturas e credos. E agora tendo-vos diante dos olhos – vós, que não sois da mesma religião e não tendes medo de estar juntos –, penso que uma tal convivência das diferenças não seria possível sem vós; nem teria futuro! Na massa do mundo, vós sois o fermento bom destinado a levedá-la, superando tantas barreiras sociais e culturais e multiplicando rebentos de fraternidade e de novidade. Como se fôsseis inquietos viajantes abertos ao inédito, vós, jovens, não temeis confrontar-vos, dialogar, «fazer barulho» e misturar-vos com os outros, tornando-vos a base duma sociedade amiga e solidária. E isto, queridos amigos, é fundamental nos contextos complexos e plurais em que vivemos: derrubar determinadas barreiras a fim de se inaugurar um mundo que seja mais à medida do homem, mais fraterno, ainda que isso signifique enfrentar numerosos desafios. A propósito disto e tirando partido dos vossos testemunhos e perguntas, quero fazer-vos três convites simples, não tanto para vos ensinar qualquer coisa mas sobretudo para vos encorajar.

O primeiro convite: abraçar a cultura do cuidado. A irmã Rosalyn usou esta expressão: «cultura do cuidado». Cuidar significa desenvolver uma atitude interior de empatia, um olhar atento que nos leva para fora de nós mesmos, uma presença gentil que vence a indiferença e nos impele a interessar-nos pelos outros. Este é o ponto de viragem, o início da novidade, o antídoto contra um mundo fechado que, impregnado de individualismo, devora os seus filhos; contra um mundo enclausurado pela tristeza, que gera indiferença e solidão. Deixai que vos diga: Como faz mal faz o espírito de tristeza! Tanto mal! Com efeito, se não aprendermos a cuidar daquilo que está ao nosso redor – dos outros, da cidade, da sociedade, da criação –, acabamos por transcorrer a vida como quem corre, se afadiga, faz muitas coisas, mas, no final, permanece triste e pelo simples motivo que nunca saboreou profundamente a alegria da amizade e da gratuidade, nem deu ao mundo aquele toque único de beleza que só ele ou ela, e mais ninguém, poderia dar. Como cristão, penso em Jesus e vejo que a sua ação sempre esteve animada pelo cuidado. Cuidou as relações com quantos encontrava nas casas, nas cidades e pelo caminho: fixou as pessoas nos olhos, prestou atenção aos seus pedidos de ajuda, aproximou-se e tocou com a mão as suas feridas. Vós, fixais as pessoas nos olhos? Jesus entrou na história dizendo-nos que o Altíssimo cuida de nós; lembrando-nos que, estar da parte de Deus, significa cuidar de alguém e dalguma coisa, especialmente dos mais necessitados.

Amigos, como é bom tornar-se cultores do cuidado, artistas das relações! Mas isto, como tudo na vida, requer um treino constante. Então não vos esqueçais de cuidar primariamente de vós mesmos: não tanto do exterior, como sobretudo do interior, da vossa parte mais escondida e preciosa. Qual é? A vossa alma, o vosso coração! E como se faz para cuidar do coração? Tentai escutá-lo em silêncio, criar espaços para estar em contacto com a vossa interioridade, para sentir o dom que sois, para acolher a vossa existência e não a deixar fugir de mão. Não vos aconteça ser «turistas da vida», que a olham apenas de fora, superficialmente. Mas, no silêncio, seguindo o ritmo do vosso coração, falai com Deus. Falai-Lhe de vós mesmos e também daqueles que encontrais diariamente e que Ele vos dá como companheiros de viagem. Levai à sua presença os rostos, as situações felizes e dolorosas, porque não há oração sem relações, tal como não há alegria sem amor.

E, como sabeis, o amor não é uma telenovela nem um filme romântico: amar é ter a peito o outro, cuidar do outro, oferecer o próprio tempo e os próprios dons a quem deles precisa, arriscar para fazer da vida um dom que gera nova vida. Arriscar! Amigos, por favor, nunca vos esqueçais duma coisa: sois todos – sem exceção – um tesouro, um tesouro único e precioso. Por isso, não mantenhais a vida num cofre, pensando que é melhor poupar-se e que o momento de a gastar ainda não chegou! Muitos de vós estão aqui de passagem, por motivos laborais e, frequentemente, por um prazo limitado. Mas, se vivermos com a mentalidade do turista, não agarramos o momento presente e corremos o risco de deitar fora pedaços inteiros de vida. Ao contrário, como é bom deixar agora um bom rasto no caminho, cuidando da comunidade, dos companheiros de escola, dos colegas de trabalho, da criação... A propósito, far-nos-á bem questionar-nos: Que rasto estou a deixar agora, aqui onde vivo, no lugar onde a Providência me colocou?

Este é o primeiro convite: a cultura do cuidado. Se a abraçarmos, contribuímos para fazer crescer a semente da fraternidade. E aqui está o segundo convite que vos quero dirigir: semear fraternidade. Gostei do que disseste tu, Abdulla: «É preciso ser-se campeão não só nos campos de jogo, mas também na vida». Campeão fora do campo. É verdade! Sede campeões de fraternidade, fora do campo. Este é o desafio de hoje para vencer amanhã, o desafio das nossas sociedades cada vez mais globalizadas e multiculturais. Vede! Todos os instrumentos e a tecnologia que a modernidade nos oferece, não bastam para tornar o mundo pacífico e fraterno. Temo-lo diante dos olhos: de facto, os ventos de guerra não se aplacam com o progresso técnico. Com tristeza constatamos que, em muitas regiões, as tensões e as ameaças aumentam e, por vezes, deflagram nos conflitos. Frequentemente, porém, isto acontece porque não se trabalha o coração, porque se deixam ampliar as distâncias em relação aos outros e, assim, as diferenças étnicas, culturais, religiosas e outras tornam-se problemas e temores que isolam, em vez de ser oportunidades para crescer juntos. E, quando se mostram mais fortes do que a fraternidade que nos une, corre-se o risco do conflito.

A vós, jovens, que sois mais diretos e mais capazes de gerar contactos e amizades, superando os preconceitos e as barreiras ideológicas, quero dizer: sede semeadores de fraternidade e recolhereis futuro, porque o mundo só terá futuro na fraternidade! É um convite que encontro no coração da minha fé. Como diz a Bíblia, «aquele que não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê. E nós recebemos d’Ele este mandamento: quem ama a Deus, ame também o seu irmão» (1 Jo 4, 20-21). Sim! Jesus pede para nunca desligarmos o amor a Deus do amor ao próximo, fazendo-nos nós mesmos próximo de todos (cf. Lc 10, 29-37): de todos, e não só de quem nos é simpático. Viver como irmãos e irmãs é a vocação universal confiada a toda a criatura. E vós jovens – sobretudo vós –, face à tendência dominante de permanecer indiferentes e mostrar-se impaciente com os outros, até ao ponto de aprovar guerras e conflitos, sois chamados a «reagir com um novo sonho de fraternidade e amizade social que não se limite a palavras» (Francisco, Carta enc. Fratelli tutti, 6). As palavras não bastam; há necessidade de gestos concretos realizados no dia a dia.

Ponhamo-nos, aqui também, algumas perguntas: Estou aberto aos outros? Sou amigo ou amiga de qualquer pessoa que não faça parte do meu círculo de interesses, que tenha credo e costumes diferentes dos meus? Procuro o encontro, ou fico na minha? O caminho – assim no-lo disse Nevin, em poucas palavras – é «criar boas relações», com todos. Geralmente em vós, jovens, há um forte desejo de viajar, conhecer novas terras, ultrapassar os confins dos lugares habituais. Pois bem! Deixai que vos diga: sabei viajar também dentro de vós mesmos, alargar as fronteiras interiores, para que caiam os preconceitos sobre os outros, se restrinja o espaço da difidência, se desmoronem os recintos do medo, germine a amizade fraterna! Também aqui deixai-vos ajudar pela oração, que alarga o coração e, abrindo-nos ao encontro com Deus, ajuda-nos a ver, em quem encontramos, um irmão e uma irmã. A propósito, são belas estas palavras dum profeta: «Não foi o mesmo Deus que nos criou? Por que razão, pois, somos nós pérfidos uns para com os outros?» (Ml 2, 10). Sociedades como esta do Bahrein, com uma notável riqueza de credos, tradições e línguas diferentes, podem tornar-se «ginásios de fraternidade». Aqui estamos às portas do grande e multiforme continente asiático, que um teólogo definiu «um continente de línguas» (A. Pieris, Teologia na Ásia, Brescia 2006, 5): sabei harmonizá-las numa única língua, a língua do amor, como verdadeiros campeões de fraternidade!

Quero ainda fazer um terceiro convite, relacionado com o desafio de fazer opções na vida. Como bem sabeis pela experiência de cada dia, não existe uma vida sem desafios a enfrentar. E perante um desafio, como numa encruzilhada, sempre é preciso escolher, entrar em jogo, arriscar, decidir. Mas isto requer uma boa estratégia: não se pode improvisar, vivendo só por instinto ou circunscrito a cada instante! E como se faz para preparar-se, treinar a capacidade de escolher, a criatividade, a coragem, a tenacidade? Como aperfeiçoar o olhar interior, aprender a julgar as situações, a captar o essencial? Trata-se de crescer na arte de se orientar nas escolhas, de tomar as justas direções. Por isso, o terceiro convite é fazer opções na vida, opções certas.

Tudo isto me veio em mente, ao repassar as perguntas de Merina. São interrogativos que expressam precisamente a necessidade de compreender a direção que se deve tomar na vida. És uma jovem corajosa, pelo modo como disseste as coisas! E posso contar-vos a minha experiência: era um adolescente como vós, como todos, e a minha vida era a vida normal dum rapaz qualquer. Como sabemos, a adolescência é um caminho, uma fase de crescimento, um período em que assomamos à vida com os seus aspetos por vezes contraditórios, enfrentando pela primeira vez certos desafios. Pois bem! O meu conselho, qual é? Avançar sem medo, e nunca sozinhos! Duas coisas: avançar sem medo, e nunca sozinhos! Deus não vos deixa sozinhos, mas, para vos dar uma mão, espera que Lha peçais. Acompanha-nos e guia-nos, não com prodígios e milagres, mas falando delicadamente através dos nossos pensamentos e sentimentos e também por meio dos nossos professores, dos nossos amigos, dos nossos pais e de todas as pessoas que nos querem ajudar.

Por isso é preciso aprender a distinguir a sua voz, a voz de Deus que nos fala. E como aprendemos isto? Como nos dizias tu, Merina: através da oração silenciosa, do diálogo íntimo com Ele, guardando no coração aquilo que nos faz bem e dá paz. A paz é um sinal da presença de Deus. Esta luz de Deus ilumina o labirinto de pensamentos, emoções e sentimentos em que, muitas vezes, nos movemos. O Senhor deseja iluminar a vossa inteligência, os vossos pensamentos mais íntimos, as aspirações que trazeis no coração, os juízos que amadurecem dentro de vós. Quer-vos ajudar a distinguir o essencial daquilo que é supérfluo, aquilo que é bom daquilo que faz mal a vós e aos outros, aquilo que é justo daquilo que gera injustiça e desordem. A Deus, nada é alheio de quanto nos acontece, nada! Muitas vezes, porém, somos nós a alhear-nos d’Ele, não Lhe confiando as pessoas e as situações e fechando-nos no medo e na vergonha. Assim não! Alimentemos na oração a certeza consoladora de que o Senhor vela por nós, que não dorme, mas sempre nos vê e guarda.

Amigos, jovens, esta aventura das opções, não a devemos realizar sozinhos. Por isso deixai que vos diga uma última coisa: procurai sempre – antes das sugestões da Internet – bons conselheiros na vida, pessoas sábias e fiáveis que vos possam orientar, ajudar. Primeiro, isto! Penso nos pais e professores, mas também nos idosos, nos avós e num bom acompanhante espiritual. Cada um de nós precisa de ser acompanhado no caminho da vida! Repito o que vos disse: nunca sozinhos! Precisamos de ser acompanhados no caminho da vida.

Queridos jovens, precisamos de vós, da vossa criatividade, dos vossos sonhos e da vossa coragem, da vossa simpatia e dos vossos sorrisos, da vossa alegria contagiante e também daquele mínimo de turbulência que sabeis trazer a cada situação e que ajuda a sair do torpor de hábitos e esquemas repetitivos em que às vezes encaixilhamos a vida. Como Papa, quero dizer-vos: a Igreja está convosco e tem tanta necessidade de vós, de cada um de vós, para rejuvenescer, explorar novas sendas, experimentar novas linguagens, tornar-se mais jubilosa e hospitaleira. Nunca percais a coragem de sonhar e viver em medida grande! Fazei vossa a cultura do cuidado e espalhai-a; tornai-vos campeões de fraternidade; enfrentai os desafios da vida, deixando-vos orientar pela criatividade fiel de Deus e por bons conselheiros. E, em último lugar, recordai-vos de mim nas vossas orações. Eu farei o mesmo por vós, levando-vos no coração. Obrigado!

God be with you - Allah ma’akum – Deus esteja convosco!



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